segunda-feira, 13 de dezembro de 2010



Agora que algumas coisas se concluíram, outras tendem ao mesmo caminho - como se toda a matéria tendesse ao mesmo limite - embora não na mesma velocidade, mas de uma violência tão desesperadora que tudo vai perdendo o sentido de ter acontecido.
E ver-se terminar, acabar de uma maneira tão discreta e irônica - e ao mesmo tempo não querer acreditar - que ninguém, nem mesmo quem começou, sabe que o fim tornou-se uma constante.
































[junior ferreira]

terça-feira, 28 de setembro de 2010



São poucas as vezes que posso dormir ouvindo a chuva - tão sem nexo sua chegada; faz um tempo bom, um barulho bom e acaba por fazer sentido quando tudo a evapora.

[...]

Não venha se não for para fazer sentido.

















[junior ferreira]

domingo, 26 de setembro de 2010






Não há lugar naqueles retratos
Nas gavetas, não há espaço para mais detalhes - que são meus.
Meus lápis e toda aquela história escrita por eles já não estão corretos; reminiscências imensuráveis. Esquecemos - de tudo - dos desejos.
Se toda saudade fosse lembrança, eu não poderia ter saudades de algo que nunca tive.

















[junior ferreira]

terça-feira, 14 de setembro de 2010

[...]












o mundo é meu maior problema















junior ferreira

sexta-feira, 20 de agosto de 2010


É tudo imaginação. Não estou com ela, com ele. Não estou na mata, estou em meu lugar, minha cidade que não é minha, mas não estou lá.
Esta melodia desdobra todas as minhas vontades - mesmo aquelas mais ínfimas nas quais preciso sentir o cheiro, a força do abraço e a textura da pele - e recolhe toda a esperança de não estar aqui.
O cheiro vem de longe e a vontade cresce à cada momento; não sei dizer se sou tua mãe, teu pai, irmão ou amigo; sinto você, muitos outros aspectos distorcem o que digo, entretanto - ou simplesmente jogam as palavras, por distração ou interpretação errônea, talvez.
Não estou lá, mas gosto de você.





















[junior ferreira]

sábado, 24 de julho de 2010














Gosto das árvores, de ficar deitado enquanto escuto os sussurros dos galhos rasparem na vidraça. Quanto a dizer o que são as árvores, não mais sei do que somente admira-las . E no entanto, isso perdura enquanto há vida.
Após a vida, a queda lenta dos pedúnculos verdes, enchendo o cálice da flor, à medida que vira, e nos enche de luz - momentos no qual a corola da fêmea flor exibi a nudez disfarçada entre tantos outros detalhes - banhando-nos com uma sensação ininteligével, talvez um desejo para persistir, algo que incita o apetite de viver; e viver apenas.



























[junior ferreira]

sexta-feira, 23 de julho de 2010













Do sofá, avistei, na estante, Lispetor, Cecília Meireles, Zélia Gattai e alguns anarquistas, graças a Deus -todos tão modestos e envelopados em folhas amareladas. Não hesitei, fui limpar a estante, sempre a quinta prateleira primeiro. Tantos livros, e ainda não consigo entende-los em sua totalidade - isso, talvez, é aquela coisa que eles denominam distração.
Limpei e organizei em ordem alfabética - por autores - todos os livros. Embora o lugar, escrupulosamente limpo, agora, fosse mantido em ordem, em todo o resto da sala notava-se uma estranha nudez, ausência de adornos, dos papéis pelo chão.
Notável presença daquilo que vem em certas horas para nos sufocar; uma ausência que não se descobre a origem e nem quando há de ter fim.

































[junior ferreira]

quarta-feira, 21 de julho de 2010












[A idéia de paixão o atormentou por um certo momento, e amargurado, levantou-se da cama e decidiu caminhar. De qualquer modo, seguiu em frente. A grande questão nas caminhadas é que ninguém se permite parar para descansar por muito tempo; todos logo se levantam para andar até se cansar novamente, e o desejo de acabar com o cansaço dá aos mais filosóficos, ou mesmo aos distraídos pelo amor e seus tormentos, uma sobrepujante razão para só ter um objetivo em mente, chegar em casa.
E quando se chega em casa, no lugar comum que não há solidão à de quem se vê sozinho; apaixonado mesmo sem saber por quem; como chegou àquele momento e se quis, realmente, estar ali. Pense o quão singular pareceria ficar sentado, excluindo cada momento dúbio, refletindo se se apaixonar platonicamente é um grande erro.]















[junior ferreira]















segunda-feira, 12 de julho de 2010














Um tanto incólume e incomum, dava para perceber os musgos, sorrateiramente, invadirem a casa da senhora Parvett, de acordo com que as madeiras tornavam-se menos férteis. Certamente suas janelas, ainda que briguem com o tempo, perduram na constante e frenética sensação oscilatória de se sacudirem. Não que a glória a tenha deixado, contudo a substância fora substituída pela languidez que se dispusera a cada canto.
Crescentes, as tentações não desviavam meu olhar ao tentar traduzir os epitáfios marcados na escada da mansão Parvett, embora apagados em certos instantes, visíveis em certas proporções; obscuros e desconexos de si como Elizabeth naquele lado da moeda ainda incoercível com os verdadeiros lados.
Os detalhes eram visíveis, enquanto viva. Inigualável e singular a senhora e a mansão indumentaram a cidade em diversas cores e sentidos: Amarela, quando próximo ao fim do Outono; Vermelho e marrom ao queimar os lábios pelo frêmito da paixão; Cinza ao se despertar neste nosso tempo, como se já não bastasse morta e agora acorda aquela coisa que sai de dentro da casa e deixam os ouvidos surdos.
Os retratos tornaram-se comuns. Maquiar de forma sensata, aniquilando os preceitos da verdade em recorte e borrões, fato inato a cada artista. Não compreendo mais a mansão desde que as cores passaram a multiplicar-se e transformar tudo ao redor, adquirindo a sua constante e elaborada forma. Isso remete-me ao buraco, no qual a presença da ausência intercala-se no peito. Detalhe, que talvez, denomino de saudade.





















[junior ferreira]

sexta-feira, 9 de julho de 2010














Arrumei as cadeiras em certas posições ao redor da mesa, ainda quadrada. Dissonante, a pintura da parede não se convergiu ao conjunto que eu organizei no meio da sala.
Após arrumar as cadeiras, na mesa, geometricamente, coloquei os talheres. Voltei-me ao forno, o frango ja estava dourado, não há o que impeça agora, de servi-lo da minha maneira. Sentei-me e aguardei o tempo combinado pelos amigos. Esperei. O tempo fez o seu trabalho e me fez cochilar. O frango havia esfriado, quando acordei, e os talheres estavam da mesma maneira. Resolvi servir-me então. A idéia de ter algum diálogo numa sexta-feira fora deixada pela primeira garfada, e ocorreram longos e duradouros monólogos até a ultima gota de vinho.
Ao encerrar disse a mim mesmo que iria comprar livros.






















[junior ferreira]













Equanto a empregada tentava acalmar a vizinha, ainda mais gritos saltavam das janelas. Levantei-me então e fui até o corredor, lugar no qual tudo ocorria.
A vizinha estava despida e desesperada, parecia falar em outra língua, talvez grego, suas lágrimas escorriam para cima, entravam em seus olhos. A senhora então começou a xingar a todos em grego, sim era grego. Desesperada saiu correndo pelo corredor, e bem no fim ela pulou a janela. Esta cena tornou ainda mais complexo a situação. Todas as pessoas que assistiam se entreolharam e foram se afastando. Entrei para o meu apartamento, a empregada continuou seus afazeres, nada parecia ter ocorrido.
Então acordei. Levantei-me e fui até a varanda. A vizinha estava fumando em sua varanda e acenou com a cabeça, devolvi com um sorriso, ainda torto. Eram dez da manhã e as pessoas na rua mantinham a mesma pressa de sempre. Este vínculo entre o sonho e eu mesmo quase me desvencilhou da realidade. Ao ver o mau humor tomar por completo a vizinha quando a empregada derrubara a orquídea, percebi, neste momento, que havia realmente acabado de acordar.

























[junior ferreira]

terça-feira, 6 de julho de 2010














"Ele me mandou flores hoje." contava à sua amiga como se fosse algo banal, como se receber flores fizesse parte de suas manhãs. Pelo menos era o que expressava enquanto tomava o café, e sua amiga, impaciente e curiosa, a observava, esperando mais detalhes, mais flores. Mas a conversa não progrediu, parou por ali e ambas se levantaram e saíram da cafeteria.
Fiquei ainda lá um bom tempo e as vi cruzando a rua. Enquanto a garota que parecia solteira falava, a outra fazia gestos como se já soubesse de tudo, mostrando-se sábia, pelo menos simulava essa idéia. Senti muita preguiça e voltei os olhos ao meu café.
Nada mais escuro que o meu café, menos sólido, que trêmulamente refletia meu nariz e olhos de uma maneira a tornar-me indescritível.
Se não fossem pelas flores, talvez não teria dado tamanha atenção ao diálogo, pois justamente estas que me atraem com tal beleza e fascínio. E direciono-me às orquídeas e aos olhos da maçã que se consome no fogo de sua pele, e exibe o vermelho, entre o amarelo da banana, de dentro da vasilha bem em cima da mesa. Iluminando a sala e a cozinha, acompanhada pela leveza do sol de fim de tarde que se esvai junto ao dia, a maçã consome-se sozinha e perde o seu brilho quando grita a noite.




























[junio ferreira]

segunda-feira, 5 de julho de 2010

[alguns resmungos]


[...]













[Sob certas luzes, que se produzira através do efeito das oscilações das cortinas da janela, pergunto-me se era mesmo uma mancha na parede ou uma árvore nascendo no canto da sala. Algumas coisas em forma de galhos foram espalhando pequenos feixes deslizantes de luzes que cortavam as gavetas e depois subiam pela parede e acabavam na estante. Para ser mais preciso as luzes tinham um fim na quinta prateleira da estante, na qual iluminavam-se a teoria quântica, a literatura de Jorge Amado e Drummond, a cabeça de Raduan Nassar sustentada pelo instinto materno de Lispector, alguns CDs que desconheço a origem e a robô de alumínio, a qual exige o mínimo de força para lhe dar uma idéia de vida e faze-la andar pela prateleira de madeira, retorcendo o som de sua máquina de metal que ecoa por todo o resto da casa.]


























[junior ferreira]

domingo, 4 de julho de 2010

[Abraçaram-se num mesmo fugor como se a despedida fosse para a eternidade. Percebi que a garota morena e de cabelos compridos não parecia gostar do abraço, recebendo-o com um certo desdém, sorriu num inefável disfarce. Como se não bastasse, sua amiga transcendeu a exímia farsa num sorriso recíproco. Nenhuma das duas percebera tamanho teatro, somente eu que tentava neste momento achar, entre milhares, a chave do meu apartamento.
Elas pareciam ter se esquecido de algum detalhe e retornam a conversa descartando a primeira despedida. Falam mais algumas coisas no corredor e as unhas tiveram sua importância, finalmente, enquanto a garota morena as roia desesperadamente ao saber, talvez, de uma notícia não tão boa.
Entre tantos outros espantos, sorrisos e abraços a tarde esvaiu-se e as duas entraram em seus respectivos apartamentos. No corredor as gargalhadas ecoaram-se por um bom tempo e aquele ar penetrou em minha sala, impregnando-se em meus cabelos e pele. Até o momento do banho senti-me tão sujo quanto o dialógo que se ponderou no corredor.]




















[junior ferreira]

terça-feira, 29 de junho de 2010







[A cada dia tenho estado mais cansado, habituando-me à cada grau de cansaço.
Tenho em mente de que quando chegar naquele estado de caveira não mesmo saberei interpretar meu desespero ou mesmo adaptar-me. Integrado ao estado de verdura encontrarei-me como a estante prostrada ao lado da porta, com os sentidos congelados pela força da madeira. Os sorrisos, agora empoeirados juntos aos livros e a bagunça das prateleiras, misturam-se ao humor da sala, que quando viva exalava o mesmo sentimento.]


















domingo, 27 de junho de 2010

[Há menos de mim em mim mesmo.
Não sei traduzir essas palavras de outro modo.
Neste momento, saber me auto-interpretar é uma arquitetura ainda trabalhosa.]

Antes de chegar em casa, subi dois morros mais longos do que os de costume. Duas mulheres passaram por mim, uma delas encarou-me como se me conhecesse, a outra não parava de falar. Tenho certeza de que não conhecia nenhuma delas, mas uma sensação de dúvida me perseguiu até o momento em que as ultrapassei. Desviei-me de ambas e subi o segundo morro. Neste não havia ninguém, só mesmo eu, o chão e os meus cabelos. Minhas unhas e mãos já estavam em estado de anestesia, o frio almejava-me a cada passo.
Em casa, não encontrei nada limpo nem na sala, nem na estante, nem na cozinha. Nao senti vontade de dormir. Trouxe o Quintana na mochila, resolvi ler e esperar o cansaço vencer-me.
Quintana não me deixa cansado. Subir o morro não me deixa cansado. As mulheres sim deixam-me exausto , olham-me, sorriem e não falam nada.
Esse efêmero olhar ficou em mim até o momento de dormir. A essência da curiosidade tomou-me por completo e percebi que o anjo de porcelana, parado na estante, encarava-me com um olhar dúbio. O relógio da parede lançou-me um olhar, o retrato, a estante e os livros espalhados sobre a mesa, lançaram-me olhares, como se fosse pra eu não estar ali, lendo Quintana. E todo o resto da casa conseguiu me cansar. Tantos olhares, espamos e inquietações, tudo ao mesmo instante. Enquanto tudo me observava, fechei Quintana na página 37, desliguei as luzes e pela sala mesmo resolvi dormir. Nem o anjo de porcelana e nem o relógio deram-me boa noite.

domingo, 21 de março de 2010











Acordei bem cedo e decidi que iria viver.
O fato da minha escolha, nao sei. Acaso? Não sei.
É possivel viver. Achar que esta vivo, contudo, é possivel. A morte esteve pela manhã na minha janela, sorriu seus dentes de uma noite não tão bem dormida. Ameaçou algumas pessoas, outras ela entristeceu cegamente. Sua exata existência é um contraste. Um vinil, dois lados conhecidos que não se interpenetram. É preciso morrer para que exista, ou mesmo percebamos, algo que denominamos vida.














[junior ferreira]

terça-feira, 16 de março de 2010





As Coisas


A bengala, as moedas, o chaveiro,
A dócil fechadura, as tardias
Notas que não lerão os poucos dias
Que me restam, os naipes e o tabuleiro,
Um livro e em suas páginas a ofendida
Violeta, monumento de uma tarde,
De certo inesquecível e já esquecida,
O rubro espelho ocidental em que arde
Uma ilusória aurora. Quantas coisas,
Limas, umbrais, atlas e taças, cravos,
Nos servem como tácitos escravos,
Cegas e estranhamente sigilosas!
Durarão muito além de nosso olvido:
E nunca saberão que havemos ido.







[Jorge Luis Borges]































"esta tarde, enquanto caminhava, mais barulhos se misturaram aos meus ouvidos. Esses barulhos condensaram-se a outras sinfonias arquitetadas por não sei quem. Tudo tornou-se tão prolixo que nem mesmo percebo meu corpo"(junior ferreira)

domingo, 14 de março de 2010

barulhos












Todo poema é feito de ar
apenas
a mão do poeta
não rasga a madeira
não fere
o metal
a pedra
não tinge de azul
os dedos
quando escreve manhã
ou brisa
ou blusa
de mulher.

O poema
é sem matéria palpável
tudo
o que há nele
é barulho
quando rumoreja
ao sopro da leitura.









[ferreira gullar]










"Não consigo definir o que é arte, mas quando leio ferreira gullar eu sei que é poesia, quando ouço philip glass sei que é música." (junior ferreira)